“Uma Distopia ou Anti-utopia é o pensamento, a filosofia ou o
processo discursivo baseado numa ficção cujo valor representa a antítese da
utópica ou promove a vivência em uma utopia negativa. São geralmente
caracterizadas pelo totalitarismo, autoritarismo bem como um opressivo controle
da sociedade. Nelas, caem-se as cortinas, e a sociedade mostra-se corruptível;
as normas criadas para o bem comum mostram-se flexíveis. Assim, a tecnologia é
usada como ferramenta de controle, seja do Estado, de instituições ou mesmo de
corporações”. Assimilando esse conceito, é justamente o que podemos perceber ao
assistir “Gattaca – Experiencia Genética”. Assim como a famosa tríade distópica
literária formada pelos clássicos “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley;
“1984”, de George Orwell; e “Laranja Mecânica”, de Anthony Burgess, “Gattaca”
também continua essa linha de produções (literárias e cinematográficas) que
exploram as possibilidades de uma suposta sociedade pertencente a um futuro não
muito distante, formada pela perpetuação (muitas vezes absurda) de valores e
costumes da modernidade calcada exclusivamente nas novas concepções
tecnológicas.
Em “Gattaca”, o diretor Andrew Niccol nos expõe uma realidade
na qual o sistema de castas serve como alicerce para a sociedade, essa lógica acaba
por criar um preconceito muito grande em relação às diferentes castas, mas este
é rapidamente legitimado pela ciência. Os bebês que nascem podem ser divididos
em dois tipos: os Não Válidos, aqueles que são frutos do amor entre os pais, e
os Válidos, os condicionados em laboratórios para serem perfeitos, ou seja, sem
nenhum tipo de imperfeição natural do ser humano, como se fosse este algo artificial.
Nesse embate entre “Filhos da Natureza” X “Filhos da Ciência”, Niccol sugere um
intenso dualismo Acaso X Planejamento, é bom saber de tudo? É bom ter o
controle absoluto sobre todas as coisas no mundo?
Vincent Freeman (Ethan Hawke), o primogênito, nasceu de modo
natural, sem preparos genéticos. Ao começar pelo nome, podemos ter a noção de
marginalidade em relação à sociedade, Freeman em inglês significa “Homem
Livre”, em outros termos, Vincent era livre dos grilhões que acorrentavam todos
os indivíduos que nasciam com preparos genéticos especializados (artificialidade),
bem como seu irmão Anton.
Anton foi o segundo filho, fruto da tristeza dos pais ao
saberem dos resultados dos exames de Vincent, estes alegavam que o garoto não
passaria dos 30 anos e tinha propensão a sofrer de uma série de doenças. Sendo
assim, os genitores de Vincent resolveram que o segundo filho seria preparado
geneticamente em laboratório.
Desde pequeno, Vincent queria ser astronauta, tinha o
inabalável desejo de ir para o espaço, sair do ambiente onde o total controle
de determinada casta, elite, instituição, e corporação impera, ou seja, a
terra. Porém, tem em seu código genético predisposições a doenças que não lhe
permitem nada melhor em vida que o emprego de faxineiro. Para que fosse
realizado seu sonho, Vincent bolou um plano de falsificação de sua identidade
genética, auxiliado por Jerome Eugene Morrow (Jude Law), um Válido, mas que por
ironia do destino se torna inválido ao sofrer um acidente, alternando desse
modo os valores impostos a respeito de castas, pois um ser considerado pela
sociedade como Não Valido, como Vincent, passa a ser Válido. Tudo segue
perfeitamente, com muito esforço, até que um assassinato em seu emprego põe a
farsa montada pelos dois em risco, podendo expor todo o seu passado de Não
Válido.
O filme é uma espécie de profecia, pois o ambiente no qual se
passa nos dá a idéia de um futuro não muito distante, e tendo o longa-metragem
já mais de 10 anos, podemos considerar que o mundo em que vivemos hoje é uma
espécie de “Mundo Gattaca”. Diversas experiências científico-tecnologicas que o
Andrew Niccol retrata em “Gattaca – Experiencia Genética” pode-se ver hoje em
dia nos laboratórios do mundo inteiro, graças aos avanços da engenharia
genética e da biologia molecular. Assim como manda a cartilha de “Boas obras
artísticas de ficção científica e distopias”, a película em voga serve como um
alerta, uma advertência para a sociedade moderna não se tornar uma “sociedade
Gattaca”. E como diz cartaz do próprio filme: “Não existe gene para o espírito
humano”.
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Bruno
Lima